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A Constituição vai ser alterada (pela oitava vez)

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O texto que sustenta liberdades, direitos e garantias poderá sofrer alterações (ora mais leves, ora mais profundas) nas palavras e nos conteúdos. Os oito partidos com representação parlamentar apresentaram as suas propostas. O que vai acontecer? Ninguém sabe, por enquanto.

A última revisão da Constituição da República Portuguesa aconteceu em 2005, já lá vão 17 anos. No início deste ano, a comissão que irá analisar e debater a próxima alteração constitucional tomou posse e os políticos preparam-se para discutir o que deve mudar e o que deve ficar no texto que serve de base à vida do país.

O Chega colocou o assunto na agenda, foi o primeiro partido a apresentar as suas propostas, seguiram-se todos os outros com assento parlamentar. Avizinham-se reuniões e discussões demoradas. Até porque este não é um documento qualquer.

 

Votar aos 16 anos?

Neste momento, só é possível exercer o direito de voto quando se faz 18 anos. Nesta revisão constitucional, a redução da idade legal de votar dos 18 para os 16 anos é defendida por vários partidos: PSD, BE, PAN e Livre.

 

Pandemia e metadados

Há dois pontos que aproximam PS e PSD. Os dois partidos querem alargar as condições para decretar o estado de emergência, de forma a prever confinamentos e outras situações em caso de pandemia. Emergência de saúde pública poderá entrar na Constituição.

Em relação aos metadados, PS e PSD defendem o acesso a essas comunicações privadas em situações específicas, sempre no âmbito de investigações criminais. O PS quer que esse acesso seja possível quando está em causa “a defesa nacional, a segurança interna de prevenção de atos de sabotagem, espionagem, terrorismo, proliferação de armas de destruição maciça e criminalidade altamente organizada”. O PSD sublinha que o processo tem de estar sujeito “a decisões e controlo judiciais”. Vários partidos torcem o nariz nesta questão.

 

Ensino, saúde, habitação

Três setores basilares da sociedade. O ensino deve ser “universal, obrigatório e gratuito”, defendem PS, PSD e Chega. BE e PCP sugerem a “gratuitidade de todos os graus de ensino” desde o pré-escolar e, além disso, querem consagrar na Constituição um Serviço Nacional de Saúde (SNS) gratuito. PS, PSD, Chega e PAN propõem um SNS universal, geral, “tendencialmente gratuito”, tal como está.

Na habitação, o PS fala em “transparência” e “condições de igualdade” na atribuição de casas sociais. O BE quer atenção para a compra e arrendamentos a preços não especulativos, o PCP defende garantias especiais quanto à proteção da casa de morada de família, e o Livre bate-se pelo direito a habitar em “condições de salubridade, segurança, qualidade arquitetónica, urbanística e ambiental”.

 

Política, ambiente, animais

O PAN não larga uma das suas bandeiras e pede que a proteção animal passe a ser uma tarefa fundamental do Estado, enquanto PS e BE sugerem que a garantia do bem-estar animal deve estar prevista na Constituição. O Ambiente ganha importância nas propostas dos partidos para que as repercussões das alterações climáticas não passem despercebidas na Constituição. Na política, uma das ideias que mais têm agitado as águas surge do PSD que propõe que o presidente da República faça um mandato único de sete anos e que os seus poderes sejam reforçados.

 

Não se pode mexer em tudo

Uma coisa é rever a Constituição, outra coisa é fazer uma nova Constituição. A primeira é possível, e está em curso, a segunda nem por isso, sob pena de se passar por cima de tudo o que foi feito e construído. Há condições, limites, procedimentos para uma revisão constitucional – foram feitas sete desde 1976 (em 1982, 1989, 1992, 1997, 2001, 2004, 2005). Não se pode alterar o núcleo duro ou modificar o ADN da Constituição, como o sufrágio nacional, a separação de poderes, a independência dos tribunais. E a revisão nunca pode ser feita quando o país está em estado de sítio ou em estado de emergência. Há quem diga que a Constituição do nosso país é um documento bastante difícil de rever.

 

Livre, justa, solidária

Depois do 25 de Abril de 1974, o país mudou. Ditadura derrubada, democracia a despontar. É no contexto de um Estado de Direito que a Assembleia Constituinte aprovou, a 2 de abril de 1976, a Constituição da República Portuguesa para a construção de um país mais livre, mais justo, mais fraterno. Um texto que afirma direitos e liberdades fundamentais. Logo a abrir, no artigo 1.º, refere-se que “Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária”.

 

Igualdade, artigo 13.º

Todos são iguais perante a lei, todos têm a mesma dignidade social, segundo a Constituição. “Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação social.” Está no princípio da igualdade. Há quem defenda a substituição do termo “raça” por etnia.

 

Artigos, princípios, capítulos

A Constituição abre com um preâmbulo, que poderá ser alterado em alguns termos, tem 296 artigos organizados em princípios fundamentais, e divide-se em quatro partes. A primeira é dedicada aos direitos e deveres fundamentais, a segunda à organização económica, a terceira à organização do poder político, a quarta à garantia e revisão da própria Constituição.

 

Texto: Sara Dias Oliveira