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Florentina – Uma história que ensina ciência

Maria João Gala / Global Imagens

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A história que te vamos contar passa-se numa floresta imaginária, mas vais aprender mais sobre ciência ao lê-la. Há três personagens centrais, o Bombolas, o Floco e Lua, amigos improváveis, que vão aprender muito com a mestre Florentina. No final, há uma explicação mais científica desta narrativa.

Foi escrita pela professora Maria da Apresentação Pimenta Marques de Queirós F. Reis, de Físico-Química, que gosta de levar as crianças a observar fenómenos do dia a dia para compreenderem conceitos de ciência sem aquela linguagem específica, que só mais tarde se domina. É que a ciência não está só nos livros, ela está à nossa volta, todos os dias!

 

Florentina

 

Era assim desde que se conheceram, numa manhã ensolarada, no bosque dos cogumelos. Ninguém conseguia separar aqueles três. E amizade mais improvável estava ali! Onde é que já se viu um urso amigo de um coelho e de um veado? As mães preocupavam-se com aqueles filhos tão estranhos e os animais do bosque diziam graçolas sempre que os viam juntos. Mas eles, o urso Bombolas, o veado Floco e a coelha Lua não ligavam nenhum e, todos os dias, depois das aulas, encontravam-se para passar a tarde a brincar no bosque.

Mas agora, de repente, parecia que o grupo de amigos andava mais tristonho. É que o Floco e a Lua tinham aprendido a jogar futebol e agora era vê-los, toda a santa tarde de patita na bola! Claro que não deixavam o Bombolas de lado! Insistiam até que ele devia treinar, que o jogo era muito divertido e que os três juntos passariam belas tardes a chutar a bola!

E o Bombolas esforçava-se! Esforçava-se mesmo a sério!… Corria, corria, corria atrás da bola, mas… quando lá chegava já os companheiros lha tinham roubado. E travar depois de tanta corrida? Acabava sempre com o rabo esfolado no chão! Levantava-se a custo, pesadão…, pesadão…, e estava tão cansado que já não conseguia jogar mais!

Os amigos começavam a perder a paciência com semelhante preguiça! Pois que mais poderia ser? Afinal eles passavam o dia a correr e não ficavam assim tão cansados. Assim, o Bombolas, ia conseguir estragar as suas tardes de brincadeira e, quem sabe, aquela amizade tão bonita!

O Bombolas começava a ficar mesmo triste! Andava o dia todo de cabeça baixa e até parecia que o seu lindo pêlo tinha perdido o brilho! Ele não conseguia explicar aos seus amigos que aquilo não era preguiça! Ele queria mesmo saber jogar futebol! Mas começar a correr era tão difícil… Parecia que tinha que empurrar uma pedra de uma tonelada! Depois ganhava lanço, corria, corria e… não conseguia parar! Punha as patitas a travar, a travar, mas nunca parava no sítio que queria e, quando finalmente conseguia, ia ter ao meio do chão! Não havia meio de entender a que é que a Lua e o Floco achavam piada naquele jogo! Para já não falar que os outros não se cansavam como ele.

Começou a andar mesmo preocupado, a achar que devia estar doente. Sentava-se à porta da sua toca amargurado e magoado com os amigos, que passavam a tarde a jogar e nem o vinham visitar.

Os amigos, no bosque, comentavam entre si:

– O Bombolas já não é nosso amigo! Já nem nos quer ver. Primeiro aquelas fitas todas nos jogos de futebol e agora nem aparece! Pois se anda zangado connosco também não o vamos ver!

A verdade é que os três pensavam assim, mas os seus coraçõezitos só queriam que tudo voltasse a ser como antigamente, quando nenhuma sombra vinha perturbar as suas brincadeiras e confidências.

Os animais do bosque, que costumavam brincar com aquela amizade tão insólita, começaram a sentir a falta do rebuliço e das alegres gargalhadas que vinham do bosque sempre que os amigos se reuniam. O bosque nem parecia o mesmo. Silencioso, silencioso… cheio de sombras, até parecia habitado por fantasmas!

Resolveram então reunir-se em plenário para resolver tão intrincado problema.

O castor, membro muito respeitado naquela comunidade, com larga experiência na prática de engenharia, pediu para ser o primeiro a falar:

– O ano passado, quando quis fazer uma barragem no rápido da estrela vermelha, ali para os lados da toca da raposa, acercou-se de mim a toupeira Florentina. Eu nem a conhecia! Imaginem, há tantos anos neste bosque e quase nunca sai à luz do dia! Sempre a magicar, a magicar… ninguém sabe com o quê. Pois o que é facto é que me viu às voltas com a minha represa, sem saber por onde começar. Acercou-se de mim e, com muita simpatia, perguntou se eu precisava de ajuda. Ah, se precisava! Estava mesmo aflito. Pois ali ficou a dar-me conselhos, com muita calma. Num instante, lá estava o meu trabalho terminado. A partir desse dia, tenho um grande respeito pela opinião da toupeira Florentina. Se todos estiverem de acordo eu proponho que a consultemos para resolver o problema dos nossos três amiguinhos.

Os outros animais concordaram em absoluto com o Sr. Castor. Também eles respeitavam muito a opinião da Florentina que, já em diversas ocasiões, se mostrara uma sábia e sensata toupeira.

Decidiram então levar os amigos desavindos a casa da D. Florentina.

A caminho da casa da toupeira, o Bombolas, a Lua e o Floco caminhavam cabisbaixos, sem coragem de se encararem e de se olharem nos olhos. Estavam um bocadinho envergonhados com aquela briga, mas nenhum deles desistia da razão que achava que lhe assistia.

Quando chegaram ao pé do rápido da estrela vermelha, lá viram, ao longe, um montinho de terra muito arranjado e varrido, que era a entrada para a casa da Florentina. Quando esta avistou os visitantes, saiu cá para fora com um sorriso simpático no focinho.

O Castor foi o primeiro a falar:

-Bom dia, toupeira Florentina. Tem passado bem?

Nós estamos aqui para que nos ajude a resolver o problema destes três amigos, que têm andado de candeias às avessas.

O Castor ajudado pela Lua, pelo Bombolas e pelo Floco lá expôs o problema.

A toupeira ouviu atentamente a explicação e no fim perguntou algo de surpreendente:

-Importam-se se eu os puser em cima da minha balança?

Ficaram os três muito surpreendidos, mas sem coragem de recusar o pedido da Florentina.

A primeira foi a Lua. 4 kg, marcava a balança. A Lua era uma coelhinha muito elegante!

Depois foi a vez do Floco. A balança marcou 20 kg. A mãe veado estava muito orgulhosa! O seu Floco estava a ficar crescido!

Por fim, o Bombolas pôs-se em cima da balança. O ponteiro rodou, rodou e só parou nos 100 kg. Mas que grande urso! Estavam todos admirados!

A toupeira, que observava tudo com muita atenção, disse então:

– Eu acho que os dois estão a ser um bocadinho injustos com o Bombolas.

-NÓS!!!… Ele é um grande preguiçoso, parece que já nasceu cansado!

A Florentina continuou:

– Há uma lei, válida em todo o Universo, que diz que quanto maior for a massa de um corpo, mais difícil é mudar a sua velocidade. Isto quer dizer que é muito mais fácil pôr a mexer um seixinho da praia do que um grande penedo. O contrário também é verdade! Qualquer um consegue parar o seixinho, agora o penedo!… Diz-se que o penedo tem uma inércia muito maior. A inercia mede a “preguiça” que os corpos têm de alterar o seu movimento: se estão parados, “gostam” de permanecer parados e se estão em movimento, “gostam” de continuar à mesma velocidade. Isto é verdade para tudo o que existe, desde a formiguinha mais pequenina à maior estrela no céu. Quem se dedica a estudar estas coisas chama-lhe lei da inércia!

Os bichos estavam de boca aberta. Que coisa mais importante, lei da inércia! É que soava mesmo bem! A partir de agora haviam de falar daquela lei, para que todos ficassem a saber como eles eram sábios!

A toupeira olhou para eles, sorriu e disse:

– As palavras são coisas boas, ajudam-nos a exprimir os nossos pensamentos, mas, às vezes, podem ser traiçoeiras! Podem parecer-se com aqueles embrulhos pomposos, muito bonitos e com grandes laçarotes, mas que depois, quando se abrem, não têm nada lá dentro. Às vezes, quando as palavras não têm significado nenhum dentro da nossa cabeça, parece que está cada qual a falar a sua língua e ninguém se entende.

O que eu quero explicar à Lua e a o Floco é muito simples, nem preciso de lhes dizer que é uma lei. Como o Bombolas tem uma grande massa (uma massa inercial de 100 kg – que coisa fina!!) tem que fazer uma força muito maior para ganhar velocidade. O mesmo acontece quando quer

parar! É por isso que ele não consegue ser muito veloz e tem dificuldade em travar. Não admira que não apanhe a bola e que, no meio do jogo, já esteja cansado. Se vocês se habituarem a olhar para as coisas com muita atenção, nem precisam de me vir pedir conselhos. Estas leis vêm escritas nos livros, mas basta estarmos atentos para as lermos em todas as coisas à nossa volta!

O Bombolas tinha os olhos brilhantes de lágrimas. Afinal não estava doente nem era um preguiçoso. Só tinha era uma inércia muito grande!

O Floco e a Lua estavam envergonhadíssimos. Como tinham sido injustos!

De repente, não se sabe bem como, já estavam os três nos braços (peço perdão – nas patas!) uns dos outros! E a floresta dos cogumelos, essa, ficou outra vez cheia de vida e de risos.

***

Só para os maiores, que gostam sempre de ter uma fórmula como muleta:

A Lei da Inércia, ou Primeira Lei de Newton, é um caso particular da Segunda Lei de Newton, quando a resultante das forças aplicadas ao corpo é nula. Esta última pode ser descrita matematicamente pela seguinte expressão:

F = m x a
(em que F representa a força, m representa a massa e a a aceleração, que é a medida da variação da velocidade no tempo)

O que ela nos diz, de forma muito arrumada, é aquilo que constatamos todos os dias: se quisermos alterar a velocidade de um corpo temos que exercer uma força, que será tanto maior, quanto maior for a massa desse corpo.

Elementar, meu caro Watson!

***

Esta história integra o projeto da Associação Portuguesa dos Pequenos Investigadores – “Histórias com Ciência”