Contar o tempo: como e porquê?

Medir dias, meses e anos parece inato para as últimas gerações, que sempre viveram rodeados de calendários. Mas a contagem do tempo é uma inovação que chegou como a conhecemos no século XVI.


Uma das primeiras edições impressas do calendário gregoriano (1582). O Papa Gregório XIII é o responsável pela contagem do tempo como é hoje conhecida na maioria dos países do Mundo.

 

A agricultura está na origem dos calendários. A necessidade de as sociedades agrícolas perceberem os períodos de fertilidade da terra levou a que fossem desenvolvidos métodos de contagem do tempo.

O calendário que utilizamos atualmente em Portugal e na maioria dos países é chamado de gregoriano. Foi em 1582 que o Papa Gregório XIII marcou a mudança que perdura até hoje. O objetivo era acertar o ano civil com o ano solar, pois, com o desfasamento do calendário anterior (o juliano) em quase uma semana, o chefe da Igreja preocupava-se que as festividades religiosas não fossem celebradas no momento correto.
Face à inexatidão do calendário juliano, patenteado por Júlio César, Gregório XIII reuniu durante quase meia década uma comissão com astrónomos e físicos. Itália, Espanha e Portugal foram os primeiros países a adotar o novo método.

 

Ciência e religião

 

O calendário que saiu da comissão decorrida no século XVI, e utilizado ainda hoje, tal como a maioria dos que foram existindo ao longo do tempo, tem inspiração religiosa, por marcar o início com o nascimento de Cristo, e científica, por ter base lunar e solar. O período de um ano civil é a aproximação a um ciclo solar, ou seja, o tempo que a Terra demora a dar uma volta completa ao Sol. Já os meses marcam as fases da Lua, que geralmente são ciclos de 29 a 30 dias. As semanas são de sete dias por ter sido a divisão mais exata possível de um ciclo lunar em quatro partes iguais, com referência às quatro diferentes fases da Lua.

Quanto à designação dos dias, Portugal é um caso específico. Até ao século 6 d.C., à semelhança das restantes línguas latinas, eram referências aos deuses romanos. No entanto, o bispo Martinho de Dume considerou que deveriam ser alterados para nomes eclesiásticos. “Feira” vem de “feria”, que significa “dia de descanso”, seguindo o resto do nome uma ordem cardinal. Sábado faz referência a “Sabbath”, dia de descanso dos judeus, e o domingo é o “Dies Dominicus”, ou seja, “Dia do Senhor” – aludindo à passagem bíblica que afirma que Deus descansou ao sétimo dia, depois de criar o Mundo.

A aproximação do ano civil ao solar não é exata. O ciclo solar não demora exatamente um ano, mas antes 365,24219 dias. Acrescentar um dia no mês de fevereiro de quatro em quatro anos – no chamado ano bissexto – ou ter meses com durações diferentes são formas de acertar estes dois números, para que, ao fim de alguns anos, não estejamos, no hemisfério norte, a passar a primavera em novembro e o inverno em julho, por exemplo.

Apesar de mais próximo do ciclo solar do que os antecessores, o calendário gregoriano não é exato. Por volta de 4909, o atraso será de um dia completo, o que poderá levar a novas atualizações.

 

Outras formas de contagem

 

O gregoriano não é o único calendário atualmente em uso. Chinês, judaico, islâmico ou etíope são alguns dos exemplos utilizados ainda hoje. Apesar de todos envolverem religião e ciência, têm formas diferenciadas de contar meses e anos. Na China, e segundo o mais antigo registo temporal conhecido, considera-se que estamos no ano 4719. Pelo calendário judaico, utilizado pelo povo de Israel há mais de três milénios, encontramo-nos em 5782. O islâmico marca o início temporal na Hégira, a fuga do profeta Maomé da cidade de Meca para Medina, e está atualmente em 1443.

 

A história dos nomes dos meses

 

A forma como nos referimos aos meses também tem história. Alguns têm origem no calendário romano (criado por Rómulo e que antecedeu o juliano), como janeiro, maio e junho, em homenagem a deuses romanos – Jano, Maia e Juno, respetivamente. Fevereiro refere-se a “fébrua”, uma celebração da antiguidade romana. Do latim “aperire”, que significa a abertura das flores na primavera, surgiu abril.

O calendário romano contava apenas dez meses, tendo sido os restantes acrescentados com a mudança para o juliano. Quando Júlio César incorporou as alterações ao método de contagem temporal, por volta de 46 a.C., colocou os novos meses – janeiro e fevereiro – no final do ano, e não no início. Assim, os calendários anteriores ao gregoriano iniciavam o ano com março.

Agosto, que antes do calendário gregoriano era chamado de “sextil”, referia-se à sua posição no calendário, pois era o sexto mês do ano. Setembro, outubro, novembro e dezembro seguem, ainda, a mesma lógica, referindo-se à sétima, oitava, nova e décima posições, respetivamente, no calendário juliano. Julho serve de homenagem ao próprio imperador Júlio César, que nasceu neste mês.

Texto: Sara Sofia Gonçalves