Comissões de inquérito: Escrutinar, escrutinar, escrutinar

Comissões de inquérito: Escrutinar, escrutinar, escrutinar

Indemnizações, gestão, interesse público, responsabilidade da tutela, intervenção do SIS – audições da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à TAP dominaram boa parte das notícias durante três meses. Mas que ferramenta é esta? E em que é que se pode traduzir?

 

O que é uma CPI

 

É um inquérito conduzido por um conjunto de deputados que pretendem apurar dados factos sobre um determinado assunto. As comissões parlamentares de inquérito funcionam como um mecanismo democrático que ajuda a cumprir uma função essencial do Parlamento: escrutinar o trabalho do Governo e da administração pública.

 

Que poderes têm

 

Os deputados que integram uma CPI têm o direito de requerer acesso a todas as informações e documentos que lhe pareçam úteis (mesmo que sejam documentos confidenciais), o que pode ser importante para descobrir possíveis ilegalidades. Têm também o poder de convocar qualquer cidadão para depor, sendo que no caso das mais altas figuras do Estado o depoimento pode ser feito por escrito. Pode ainda ser solicitada ajuda às autoridades judiciárias, aos órgãos da polícia criminal e às autoridades administrativas.

 

E consequências?

 

Há um dado que é importante reter: o propósito das CPI não é aplicar a Justiça, mas sim escrutinar. Mergulhar mais a fundo num determinado tema e esclarecer os portugueses sobre o comportamento de governantes e administradores públicos. Isso, no limite, pode levar a que certas pessoas sejam afastadas dos cargos que ocupam – que mais não seja por se tornar evidente para a opinião pública que não têm condições para continuar. O trabalho das comissões pode ainda ser aproveitado pelo sistema judicial, com a abertura de inquéritos do foro criminal (mas não é o mais frequente).

 

O histórico

Ao longo de mais de quatro décadas, foram muitos os assuntos abordados pelas comissões de inquérito. Desde o caso Camarate (relativo ao desastre aéreo que, em 1980, vitimou Francisco Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa, respetivamente o primeiro-ministro e o ministro da Defesa da altura) à queda da ponte de Entre-os-Rios (que causou 59 mortes), passando por várias inquirições a instituições bancárias.

E se a dimensão dos resultados pode ser questionada, vale a pena recordar que estas comissões permitiram perceber o que se passou exatamente com os lesados do BES (pessoas que tinham investido as poupanças em certos produtos e acabaram por perdê-las, quando o banco foi à falência). E também desvendaram os esquemas de Joe Berardo, conhecido empresário e colecionar de arte português.

 

O caso da TAP

 

E afinal, por que razão foi criada a CPI à TAP? O mote foi o pagamento de uma indemnização avultada (500 mil euros) a Alexandra Reis, antiga administradora da companhia aérea, que pouco depois foi nomeada para outra empresa pública – o que faz pouco sentido. E mais tarde chegou a secretária de Estado do Tesouro.

O caso levou à demissão da ex-governante, mas, mais do que isso, gerou uma ampla discussão sobre a gestão que tem sido feita na transportadora aérea nacional.

Ao longe de 167 horas de audição, falou-se da famosa indemnização, mas também do processo de privatização e renacionalização da companhia, dos negócios de aquisição de novos aviões, de serviços de consultoria e até de um episódio no Ministério das Infraestruturas que envolveu um alegado roubo de um computador e a intervenção do SIS (Serviço de Informações de Segurança).

Texto: Ana Tulha
Foto: Reinaldo Rodrigues/Global Imagens